domingo, 21 de fevereiro de 2010

O barco e o escorpião







O sol ainda não havia se mostrado quando fomos levados para o pequeno porto da Ilha dos Padres. Tudo muito silencioso, quase escondido, e tudo feito com muita pressa. Nos levaram para o fundo do navio, separando as crianças em duplas, e apenas aqueles que haviam se consagrado sacerdotes tiveram permissão para permanecer na proa. Quando nos colocaram em uma das salas do deck de carga, trancaram a porta. Não podíamos ouvir um único som de fora da sala. Alguma coisa estava errada.

Não sei quanto tempo esperei para tentar sair daquele lugar, mas lembro de termos chegado a adormecer. A porta estava trancada e não adiantava tentar chamar alguém, já que se nós não podíamos ouví-los, eles também não nos ouviriam.

Começamos a ficar com fome e eu e meu amigo, Sam, voltamos nossa atenção para os barris que estavam por ali. Com receio, eu mandei que ele abrisse alguns barris, onde um possuía areia, outro algumas frutas estranhas das quais Sam se aproveitou e o outro... O outro estava cheio de escorpiões, enormes e venenosos. Sam fechou-o mais do que depressa, e descobrimos um pouco tarde, que com muita força.

Com medo, não sei se de ser escravo, como era óbvio naquele momento, ou de ser morto pelos escorpiões, tentamos arrombar a porta. Pesada demais para mim, Sam se encarregou do arrombamento enquanto eu me livrava dos escorpiões mais próximos. Na metade do trabalho, quando as vigas de madeira começavam a ceder, mas ainda era insuficiente para que qualquer um de nós pudesse passar pelo buraco, o navio começou a inundar. Socando a porta com desespero, foi quando conseguimos sair da sala que vimos a enorme pinça furando a porta em frente a nossa e começamos a ouvir o alvoroço no convés acima de nossas cabeças.

Subimos a escada em um pulo, e pudemos ver os marinheiros tentando controlar o barco enquanto entrávamos em uma enorme gruta em uma montanha. Não muito depois que nós subimos, o chão do convés se partiu onde deveria ser a cela em frente a nossa e um enorme monstro, metade escorpião, metade homem, saltou em frente aos marinheiros e começou a atacar tudo que havia em sua frente. Os homens atacaram o animal, na maior parte das vezes em vão, tentando prender sua preciosa carga. Alguns se jogaram na água, o que parecia ser o mais sensato a fazer, já que dentro da gruta não teríamos chance de ver de onde viria o golpe que nos mataria.

Sam arremessou uma bala de canhão na cabeça do monstro enquanto eu alcancei a espada de um dos marinheiros. Sem chances de vencê-lo, gritei para Sam que se jogasse ao mar, e fiz o mesmo. Agarrei meu amigo na água, lembrando que ele não sabia nadar, e subímos nas pedras da gruta. Percebemos que ali havia um caminho que levava cada vez mais para dentro da caverna, e não vendo outra escolha, seguimos.

O barco adentrou pelo buraco rapidamente, e ao passar por nós, pudemos ver o enorme homem-escorpião lutando contra os marinheiros que sobraram. Quando já estava bem a frente, uma enorme bola de fogo veio em nossa direção sendo lançada do navio, e pondo-o em chamas. Pulamos na água para evitar o golpe, e ao subirmos novamente no caminho ouvimos os gritos de desespero do barco, dizendo que o animal ainda estava vivo. No momento que outra esfera de fogo veio em nossa direção, entramos em uma passagem feita na pedra e corremos para que o fogo não nos alcançasse. Uma leve sensação como a de ter acabado de sair da água foi o que precedeu nossa aparição em uma floresta. Sem nada atrás de nós a não ser as pedras de uma montanha, nada diria que nós acabaramos de escapar do inferno.
Mas era cedo para comemorar... Andamos pouco mais de uma hora até chegarmos em uma clareira e pararmos um pouco para descansar e tentar descobrir o que tinha acontecido. Não passaram-se mais de 2 minutos até que começássemos a ser atacados, alvejados por flechas.

Procuramos nos proteger e logo vimos que estávamos cercados. Podiamos fugir, sempre se pode correr o risco de virar as costas e fugir. Mas não era o estilo de Sam fugir. Ele era forte, muito forte, ainda mais para um garoto de 16 anos. Então ele decidiu enfrentar nossos agressores. Agressores, que apesar de pequenos e com uma aparência que lembrava pequenos lagartos humanoides de pouco mais de 1 metro de altura, estavam atacando a distancia com flechas. E estavam em maior numero. E ele, Sam, era apenas 1 homem desarmado e sem treinamento com seu amigo que tinha uma pequena espada enferrujada na mão.

Não tivemos chance. Ele não teve chance.

Antes mesmo de conseguir alcançar o primeiro deles ele foi alvejado por pelo menos 6 flechas, certeiras, que o fizeram tombar. Não tive muito tempo para pensar ou olhar. Ele estava morto, simplesmente morto em segundos na minha frente sem que eu pudesse fazer nada para ajudar. Então eu fiz a única coisa que podia naquele momento: fugi. Corri dali como se minha vida dependesse disso. E de fato, dependia! Corri sem olhar pra trás por muito tempo, tentando não pensar, sentindo apenas uma dor enorme no peito que mexia com a confusão da velocidade dos fatos. E reforçava uma briga que seria, pra mim, eterna:

- Ele não pode estar certo... Mas ele estava certo, eu não pude fazer nada... Ele não vai mais estar certo! Não para sempre! Mask não estará certo!

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